O Reino dos Castelos Esquecidos

O calor e o ar seco eram agonizantes. Cada um à sua maneira, todos aparecem juntos e cada um voltava mudado de alguma forma.

Íkkarus parecia o mais são naquele momento, um pouco desnorteado ainda sentado no chão de terra vermelha;
Ídris, também sentado no chão apenas refletia em silêncio;
Zvenn, de joelhos, fazia gestos quase lascivos e obscenos em si mesmo;
Evony também estava de joelhos e não conseguia conter as lágrimas, apenas chorava;
Arianna em pé, com um olhar distante à tudo apenas fazia um movimento com a mão vazia como se enfiasse uma faca na própria barriga.

Era uma quantidade inacreditável de pensamentos que todos tinham ao mesmo tempo. A vontade de apenas se entregar à loucura era muito grande. Mas aquilo não era tudo. As Brumas estavam agindo.

Havia algo a mais, parecia que aos poucos a quantidade de pensamentos começava a diminuir, como água descendo pelo ralo, parecia que as lembranças do que havia acontecido no Sonhar começavam a desaparecer. A sensação era como acordar de um sonho intenso. Primeiro os detalhes começam a sumir depois os pontos mais importantes da experiência no Sonhar também desaparecem até que o que resta é apenas uma sensação de ter vivenciado algo.

Todos tentam, por instinto e em desespero se agarrar àquelas lembranças,
Ídris tenta a todo custo manter viva a lembrança do rosto da Redcap olhando para ele com carinho e da sua vida com o médico;
Evony desesperada, também tenta se agarrar às lembranças do que tinha acabado de reviver;
Zvenn tenta manter o fogo vivo dos lugares que já queimou e da experiência com a freira;
Íkkarus também tenta manter o que lembrava de sua Quimera em outra formas e em outras vidas.

É inútil. As lembranças por fim desaparecem. Vocês sabem que estiveram no Sonhar e sabem que ajudaram uma mortal lá de alguma forma. Vocês sabem que estão mais leves do peso da culpa e que foi dada algum tipo de revelação, mas não tem ideia do que foi de fato. A sensação é como se a realidade martelasse na cabeça de cada um para encaixar uma peça quadrada em algo triangular.

OFF: Zvenn e Evony ainda se lembram dos juramentos feitos, mas não se lembram das circunstâncias ou motivações que os fizeram a fazer tais juramentos.

Evony de repente se vê em outro lugar. As últimas lembranças daqueles momentos tão difíceis vívidos no Sonhar gritavam em sua mente e ao passo que a Sidhe tentava se agarrar a eles com toda a força que tinha, um a um, eles iam se esvaindo como a areia era carregada pelo vento naquele lugar do mundo outonal. A Bela dama chorava profundamente por mais alguns segundos e lentamente vai controlando a sua respiração enquanto as últimas lágrimas escorrem por seu rosto. 

*O que aconteceu comigo? Seja lá o que for, agora chega.*

Delicadamente ela abre sua bolsa de mão e em poucos movimentos rápidos ela corrige os olhos borrados e o retoca o vermelho dos lábios. 



Com as mãos ela ajeita seu cabelo enquanto se observa em seu belíssimo espelho de mão. 

Agora recomposta, a Baronesa de Eiluned admira a própria beleza por mais alguns instantes. Ela então se levanta e sacode a poeira vermelha do seu voile.

Era impressionante como em pouquíssimo tempo a Baronesa volta a sua compostura e elegância, seu olhar volta a ter a determinação usual enquanto ela olha ao redor e pergunta: 

"- Alguém tem alguma idéia de onde estamos?"

Ao mesmo tempo que ela parecia ter voltado a ser a mesma de sempre, algo estava diferente na Sidhe. Sua voz perdeu aquela doçura que ela se esforçava tanto para imprimir antes. A Baronesa parecia mais séria e determinada com um um brilho selvagem no olhar, o brilho de uma mulher que era capaz de qualquer coisa.

O que quer que tinha acontecido, ficava para trás por mais que Zvenn quisesse se lembrar. E seria bom demais lembrar. Seria bom demais vivenciar cada movimento, cada dor provocada, cada cara de sofrimento e de desespero, mas tudo era apenas uma sensação de que algo havia acontecido. Se colocando de pé, passa o olhar pelo local onde se encontrava. Não via nada que lhe desse resposta às palavras que a Baronesa havia falado. No entanto, a Baronesa o intrigava. Ele sabia que tinham um juramento, mas quais os termos?

*Como vou seguir algo que não me lembro? E como cobrar a parte que me cabe nesse latifúndio?* - indagava mentalmente enquanto a olhava com um misto de admiração e curiosidade. Admiração porque era bela, mesmo que ele não gostasse muito de rachas, curiosidade por saber o que os unira. Algum plano de ascensão? Talvez.

Sem responder à Baronesa, apenas faz um gesto com a cabeça indicando que nada sabia. E sem saber, espera os demais para ver se alguma revelação era lhe dada. A pista que tinha em sua mente era que uma mortal havia sido ajudada. Talvez achar essa mortal trouxesse respostas para os dilemas de sua mente.

O Nocker senti a areia quente sob as suas ancas, aquecendo-lhe e fazendo o seu corpo transpirar. Ele olhava para o nada e, ao mesmo tempo, tentava a tudo vislumbrar. Tentava segurar em sua mente todas as lembranças da aventura que tinham acabado de passar e tudo o que sua mente havia rememorado de todas as suas vidas pregressas... todas aqueles invenções, todas as formas que Pepe havia adquirido em cada uma de suas versões. Cada uma delas ia desaparecendo de sua mente, como se as engrenagens de sua mente fosse desaparecendo aos poucos, impossibilitando a relembrar-se. Como a areia que se esvai por entre os dedos do Estouvado, as lembranças vão desaparecendo... a não ser por algumas sensações de possíveis acontecimentos.

Íkkarus se ergue lentamente, batendo as areias de seu macacão enquanto via o restante de sua Mixórdia se recompor... o que havia ocorrido havia tido efeito mais drásticos em uns do que nele mesmo.... A Baronesa chorava, o Sluagh parecia excitar-se com algo... Arianna parecia no meio de um suicidio simulado... nada parecia ter sido tão fácil; ao menos a sensação leve do perdão preenchia o peito do Nocker, que observa o deserto que se estendia diante de todos.

Quando a Baronesa se recompõe e questiona a localização deles, Íkkarus, sem tirar o olhar do horizonte árido que se agigantava diante de seus olhos, a responde:

'- Acredito que essa seja nossa primeira parada, Milady... se o Sonhar nos trouxe até aqui, então era aqui mesmo que nós deveríamos chegar.'

Após a primeira confusão e a triste experiência de sair do Sonhar a realidade começa a se encaixar. O Sol estava brilhando no alto e queimava a pele. uma grande poeira parecia dominar o local. Ao olharem em volta, não conseguem enxergar nada, parecia um grande deserto, porém ao invés de areia, apenas um rachado que fazia lembrar uma senhora de idade muito avançada.

Arianna também parecia se recuperar da confusão, ela não parecia incomodada com o calor e olha em volta.

Não conseguiam identificar nada, nenhuma viva alma, Zvenn não escutava próximo de si nenhum som, exceto de um leve ronco como se algumas máquinas estivessem ligadas, porém muito distantes. O som, mesmo longe, parecia aumentar aos poucos.

O Eshu contamplava o nada enquanto olhava para dentro de sí novamente, ele era um infinito inexplorável, ele era a jornada de muitas vidas..

*Minha outra vida..*

A dor dos membros, a sabedoria, tudo começa a se esvair, e, apertando instintivamente as mãos..

*Grãos..*

.. Os grãos de areia que traz à frente de seus olhos com a mão, começam a se esvair na mesma velocidade que suas lembranças escoavam, e, como um amante que dá adeus a uma velha amada em seu leito de morte, no outono de seu tempo, ele se resigna a sorrir pela boa vida e encher seus olhos com as aguas que podiam fazer qualquer grão de areia se perder..

Sem saber o porque, Idris estava igual e diferente, mas, inegavelmente tranquilo.

Levantando-se e batendo a poeira de suas calças, ele se dá conta da pergunta da baronesa, e, mesmo sem ter percebido a descompostura anterior, a encara com uma simpatia que não houvera antes..

*Nada nela é errado, ela apenas é..*

"-Nosso mestre construtor está corretíssimo Lady Evony, estamos onde deveríamos estar, pois, qualquer canto em que estivermos faríamos nos servir de maneira apropriada..."

A fala do Exu era novamente carregada de empolgação, não a abobalhada de outrora, mas, um tipo completamente diferente de segurança..

"-Agora, devemos ter companhia em breve, ponham uma boa máscara e, relembrem nossa missão e do que não devemos falar.."

A Baronesa agora recomposta escuta as palavras do Nocker e apenas pensa:

*Obrigada pelo óbvio. Por que eles não podem responder uma simples pergunta? Como é difícil liderar esses ingratos.*

Ao passo que fel, ela responde apenas com um tom de voz travesso:

"-  E aqui estamos então..."

O Exu dá uma resposta semelhante e Evony apenas sorri.

*Obrigado homens por me explicarem o óbvio como se eu não fosse capaz de entender.*

Mas o Exu traz novas informações pelo menos e Evony sorri quando ele menciona uma máscara pois a dela já estava perfeita. A Sidhe põe a mão sobre os olhos enquanto deseja que tivesse óculos escuros no seu Voile para poder enxergar melhor em busca do que Idris fala e observa um Javali Selvagem no meio daquele cenário desértico.

*Mas o que diabos esse porco está fazendo aqui? E por que eu tenho a sensação de que já quis ter um porco de estimação?*

A Sidhe se aproxima do Javali enquanto pensa sobre o assunto. Podia ver que ele tem uma contraparte mundana bem diferente do que ele era realmente e ela pensa:

*Nós dois aparentamos algo bem diferente do que somos por dentro... Está decidido, agora você é meu.*

Evony então instintivamente pega um trufa que não sabia como tinha ido parar em suas coisas e fala com a sua autoridade sempre enquanto oferece o petisco ao animal:

"- Venha Porco. Agora você será meu servo e eu serei sua mestra.”

Vocês escutam ao longe um grito feminino. Parecia um pouco distante mas não muito. Havia um pouco de vegetação nativa pelo local que impedia de visualizar totalmente o horizonte, mas era acessível.

Os roncos que antes eram ouvidos apenas por Zvenn começavam a aumentar, pareciam roncos de motores e era possível identificar uma grande nuvem de poeira ao longe na direção dos mesmos roncos. Ariana faz seu florete flamejante aparecer e sem olhar para trás parte em direção ao grito.

A Baronesa seguia de volta com seu Porco quando então escura um grito feminino. A intempestiva Fiona logicamente sai correndo na direção do perigo e Evony apenas suspira longamente e faz sinal para a mixórdia seguir na mesma direção enquanto ela caminhava sem correr com seu Javali. Pegaria muito mal voltar sem a Sidhe para o Ducado!

O Exu sorria largamente, mesmo com todos os acontecimentos..

Quando começa a acompanhar as Sidhes, ele continua a sorrir..

*COMO É BOM CORRER...*

Divertido e ainda animado, mesmo sem ter razões para tal, ele se pega pensando..

*O Que diabos essas Sidhes estão a fazer? Hahahahahaha..*

Ele não sabia, mas, seguia próximo as duas.

A conversa parece que para por ali. Eles obviamente estavam nos reinos dos Castelos Esquecidos... ali já não era mais o Ducado de Belo-Mar. O silêncio que se forma depois da rápida fala da Sidhe é quebrado pelo som do ronco de um motor... um não, sete! Ikkarus sequer presta atenção nos gritos que escuta, sua mente registrava apenas o som do ronco dos sete motores. Ele, então, vê Arianna correr na direção, sendo seguida por Idris. A Baronesa parecia preocupada demais em empinar o seu popozão enquanto andava lentamente na mesma direção.

Ikkarus corre e se aproxima de Arianna e Idris, gritando para os dois:

‘- Não é apenas uma pessoa... são sete! Estão montados em motos...’

O Nocker para para escutar melhor, ele funga o ar tentando captar melhor as vibrações, os cheiros:

‘- ... e que trabalho, amigos! Parece um trabalho para um Nocker bem habilidoso! SETE MOTOS! SETE MOTOS EVENENADAS!’

Ele sente mais uma vez o cheiro do ar, arregalando seus olhos... ele não acreditava o que estava sentindo:

‘- Puta que pariu! Isso é de cair o cu da bunda! Amigos, uma dessas motos é movida pelo próprio ódio... ISSO MESMO: Pelo-proprio-ódio!’

Mais uma fungada e ele acrescenta:

‘- Tem uma movida pela seca... ISSO! As temperaturas e pressões da seca... QUE FODA!’

Outra fungada, mais informações:

‘- As outras são movidas a Madeira mesmo! Enfim, acredito que precisemos de um plano... dessa vez não é apenas dois Thallains idiotas!’

As palavras do Nocker saiam com um misto de receio, mas de empolgação. O trabalho parecia muito bem feito... bem feito até demais! Eles já deveriam ter aprendido que correr na direção de gritos bem-vinda sempre era a melhor solução.

*Era só o que me faltava! Uma gangue de cangaçeiros motociclistas para me encher a paciência! Não sei o que é pior: ter que lidar com essa gangue, esse calor infernal ou ter que escutar essa ladainha do Nocker sobre motos idiotas... HOMENS.. argh!* Pensa a Baronesa enquanto escuta as palavras de Ikkarus.

“- Saquem suas as armas e mantenham a guarda. Não sabemos quem estamos encontrando, mas lembrem-se que estamos em uma missão diplomática e devemos tentar conversar primeiro.”


Evony então se mantém junto ao Sluagh e o Porco deixaria que os demais tomassem a dianteira.

Os roncos de motor pareciam aumentar junto com a poeira, após um tempo é possível visualizar uma cena improvável, mas que Ikkarus já havia identificado pelo som dos motores, ao longe visualizam uma moto, depois um pouco mais atrás mais algumas motos vinham seguindo.

Motos no sertão não parecia algo comum, ainda mais algo que parecia um moto-clube. Aos poucos as motos vão se formando e a cena fica ainda mais estranha. Não eram motos comuns, eram motos customizadas que pareciam ter saído direto de um cenário Mad Max com longos canos de descarga que soltavam e faiscavam fogo.  E como não se fosse esquisito o suficiente os motoqueiros usavam roupas, chapéus e armas típicos de cangaceiros.

O líder um pouco mais a frente usava um chapéu de couro vermelho sangue e de longe já se podia notar que ele não tinha um dos olhos, ele tinha um sorriso cheio de dentes. Obviamente, um Redcap.


Um pouco mais atrás, á esquerda do líder havia um cangaceiro todo de preto.


Ao lado do de preto, havia outro com roupas mais intricadas e um óculos estranho.


Á direita do líder, uma mulher que não trajava roupas de cangaceira, apenas uma vestido leve branco, onde o pano dele ficava esvoaçante conforme a moto corria. Ela parecia muito branca, e um pouco cadavérica.


As outras motos eram ocupadas por cangaceiros que pareciam humanos normais, talvez Kinains.

Eles aceleram em direção à Mixórdia e abrem a formação para cercá-los e começam a rodear vocês com suas motos. O líder grita para os outros:

" - ARRE QUE NÃO É MULA-SEM-CABEÇA! SÃO SÓ UNS GRINGOS AVOADOS AQUI! UM DOCINHO TAMBÉM E UMA MULHER-HOMI! RIOBALDO VAI GOSTAR! AHUAHUAUAHAU"

Eles param de rodar em volta da Mixórdia, o líder tinha uma carabina na mão e fala com um sorriso debochado:

" - E QUAL A GRAÇA DE VOCÊS QUE VAGUEIAM PELO REINO DE RIOBALDO SEM A AUTORIZAÇÃO? DETESTO MATAR DESCONHECIDO."

O Nocker cangaceiro de óculos fala olhando pra Evony:

" - Ô MULÉ BUNITA DA GOTA SERENA."

A Baronesa se via de repente cercada por um bando de selvagens num lugar desértico e via que sua inteligência era realmente incomparável, estava enfrentando uma gangue de cangaçeiros motociclistas como havia previsto.

A Nobre repassa o que lembra sobre a região e o fato dela estar em missão pelo Ducado não significaria nada para aquele bando de selvagens. Só lhe restava uma outra opção: Mentir. 

Um plano rápido passa pela cabeça da ardilosa Baronesa e ela dirige seu melhor sorriso ao líder dos selvagens e fala com sua voz rouca e sexy:

“- Eu sou a Baronesa Evony de Eiluned e está é a minha mixórdia. Viemos do Ducado do Belo Mar com notícias urgentes para Riobaldo, o líder destas terras.  Vocês poderiam nos levar até ele?” 


Evony sorri com doçura e mas mantém sua postura firme ao do seu Javali.

*Máquinas?* - Zvenn olhava e buscava com seus sentidos encontrar de onde elas vinham ou algum sinal delas naquele solo rachado que não sabia exatamente onde era.

Não tarda para que o grito feminino e o barulho aumente. Junto com ele, uma nuvem de poeira surgia. Arianna com uma espada flamejante já parte descontrolada na direção do som sem sequer conversar com ninguém. Os olhos do Sluagh, por instinto buscam a Baronesa que indica que seguissem o caminho. Zvenn então segue, sem pressa. À frente da Baronesa, mas atrás dos demais. Não nascera para ser escudo, suas habilidades eram outras e ele sabia muito bem disso.

*E nesse descampado ensolarado elas são quase todas inúteis.* - refletia enquanto caminhava rumo à uma situação que não tinha ideai qual seria.

O Nocker então resolve ficar excitado diante de tanto perigo. Era fato, tinham no grupo alguém que devia estar querendo trepar com as incríveis motos que descrevia.

*Isso explica o ronco dos motores...*

A Baronesa é quem toma a palavra e busca a diplomacia. O Sluagh buscava rotas de fuga mas no meio do descampado elas eram completamente inexistentes, acreditava ele. Dependiam da Baronesa para saírem dali com vida. Os olhos do Sluagh tentavam analisar os inimigos, mas se preocupavam com Arianna e sua espada flamejante. Dada a impulsividade inicial, Zvenn tinha receio que ela tentasse alguma besteira e colocasse tudo a perder.

Sem armas estava, sem armas ficou. O crafter não era um lutador, isso era claro. Aparentemente, dependeriam da espada flamejante da Fiona e dos punhais do Exu. Assim, eis que a trupe do barulho alcança a mixórdia, arrastando poeira e fazendo barulho por todo o percurso.

Os motoqueiros cercam o grupo e facilmente Ikkarus detecta a procedência deles. Eram changelings também, todos a mando de um tal Riobaldo. O Nocker olha para o seu “primo” nordestino... provavelmente, o criador de cada uma daquelas peças que ali estavam. Nesse meio tempo, a baronesa decide tentar enganar os cangaçeiros do agreste por meio de sua língua afiada. Ela era boa nisso, então era justo esperar para ver se eles cairiam na sua ladainha.

Ikkarus observava o cenário. Se aquilo não desse certo, talvez eles fossem precisar de alguma ajuda externa. Qual? Ele matutava em sua cabeça.

Aparentemente, todos sabiam mais que o Exu.

O Nocker parecia sentir no ar as invenções alheias, quase como uma terceira visão oracular.

Já a Nobre baronesa, tão alheia ao combate, parecia ávida a pedir que pegassem em armas.

Todos haviam mudado, era tão perceptível quanto à mudança do tempo nas terras que você chama de suas.

Enquanto percebia e absorvia tudo isso, Idris apenas sentia o cheiro do café, o gosto de um bolo de milho quente lembrando-se de como podia ele, velho, ter coragem de tomar café com bolo quente naquela terra infernal.

*Era eu?*

Antes que se jogasse mais dentro de si e de seus próprios devaneios, aquela vanguarda motorizada chega à Mixórdia, cercando-os completamente.

Prevendo a tempestade de areia, o Exu levanta um pouco a camisa para cobrir a boca e o nariz..

*Me lembra o deserto do aquário de... merda..*

A memória lhe escapava, e, a parte mais racional de seu ser o forçava a focar-se na clara ameaça que os circundava, os tubarões de areia..

A baronesa logo lança mão de sua “diplomacia”, que, naquele momento era perfeitamente coerente com o que queriam aparentar..

*Inofensivos, avoados..*

.. mas os Redcaps não eram gostarei, e, Idris tinha uma particular antipatia pelos mesmos..

“-Idris Bancole, de lugar nenhum meu bom senhor, devo lhe dizer que sou grato, procuro a anos a resposta de um enigma me repassado por um bardo “Você jamais vai ver aquilo que o Gato Comeu!” Olhando pra você, acabo de descobrir, e, por isso, lhe sou grato...”

Idris termina sua fala com uma mesura teatral e ensaiada, tudo na expressão do Exu era pensado para não deixar a chacota clara, disfarçando-a na “loucura de um gringo afetado”.

*Eles estavam caçando algo, mas, não perguntarei nada agora antes que Evony continue a traçar sua teia..*

Não era difícil notar o kith de cada um deles, o líder um redcap, o de óculos um Nocker o de preto um Sluagh, o que Zvenn achava estranho um sluagh no meio daquela gangue barulhenta. A mulher de branco já era outra história, não havia traço de nada que a associasse a um kith em específico.

O líder escuta a exigência de Evony depois o comentário do Eshu .Ele se vira para o Sluagh do seu bando e pergunta:

" - Diabesse baitola tá falando? Ele tá mangando da minha pessoa?"


O Sluagh apenas faz um sinal de negativo com a cabeça então o líder continua:


" - Eu sou o Capitão Carniça-do-Mal, braço direito de Riobaldo e abençoado em pessoa por Nossinhora Aparicida. Se tem assunto a tratar com Riobaldo, pode tratar comigo que eu decido se vocês podem ter a prosa com ele ou com a minha peixeira."

A Baronesa não esboça reação diante da fala do Exu. Não entendia o seu propósito mas não iria interferir por enquanto. 

Evony então vira sua atenção para o Red Cap e fala com um belíssimo sorriso: 


"- É um prazer conhecê-lo Sr. Carniça do Mal. Infelizmente existem juramentos e feitiços poderosos que me impendem de revelar o conteúdo da mensagem para qualquer um que não seja Riobaldo. Mas tenho certeza que ele será grato por nos levar até ele."

A Sidh tenta usar de todo o seu charme para persuadir o Redcap.

O Redcap olha desconfiado olha desconfiado para Evony, dá uma fungada e fala:

" - Primeiramente que num é Sr. Carniça do Mal, é Capitão Carniça-do-Mal. Vocês docinhos são bons em ver a patente de vocês mas ruins em ver a nossa."


Evony então percebe que o Redcap, apesar de não ter a mesma nomenclatura, também tinha título, na verdade ele parecia estar em pé de igualdade com ela. Era algo um pouco diferente do que já tinha visto e a deixa até mesmo um pouco atordoada.


Ele prossegue:

" - Segundamente, que num acredito neesa prosa de jura e feitiço que tá me dizendo. Vamo faze o seguinte: um de vocês tem uma briga de faca com um dos meus. Se a gente ganhar a barganha, vocês deixam um de vocês com a gente. Se a gente perder, o que não vai acontecer, a gente leva vocês até Riobaldo. Como vai ser? "


Ele dispara uma faca rústica de forma muito rápida. A faca se crava no chão próximo da Mixordia e fica ali com seu cabo balançando.

A Baronesa tentava dissuadir o Redcap, mas nem toda sua malemolência parecia ser suficiente para fazer o Capitão Carniça-do-Mal cair diante de seus pés. Para além daquilo, o Exu também se pronuncia, enigmaticamente, e o Nocker apenas olha rapidamente para ele.

*Ele jura que esse jeca vai entender alguma coisa do que ele disse? Eu acho que o nosso contador de histórias vai precisar perder o outro braço para entender que existe hora e lugar para se falar... e que esse não é o momento...*

Evony tentava criar artimanhas de todas as formas, mas o líder daquele bando realmente não parecia disposto a entrar num acordo. Eles estavam no reino dos Castelos Esquecidos, aquele lugar não parecia vibrar na mesma frequência que o ducado de onde saíram. E aquilo ficava claro na proposta de Carniça-do-Mal. Uma briga de punhais. Um deles contra um do bando do Redcap. Ele olha imediatamente para Idris, o cara dos punhais da Mixordia, mas sua mente lhe leva para o bar do Bode e como ele foi massacrado numa simples sinuca contra um daqueles malditos valentões vermelhos! Tudo bem, a disputa agora era outra, mas seria o Exu realmente tão habilidoso assim?

Pelo que já haviam visto, ele parecia ser a melhor opção. Íkkarus, então, olha para Evony, esperando uma resposta sua. Se ela era a porta-voz, ela que deveria respondê-los. O Nocker só esperava que vencessem aquela disputa, porque algo no seu íntimo lhe dizia que o rabo que seria dado seria o seu!

*Tudo o que eu menos preciso é ser vendido como um pedaço de metal velho!*

O Redcap não havia notado a chacota, e, aquilo trazia uma leve brisa ao peito de Idris, que, considerava-se sortudo dado a todos os acontecimentos..

As amenidades são trocadas entre o Capitão e a Baronesa, e, Idris assistia a tudo com um sorriso no rosto, sorriso esse que QUASE fraqueja a menção da briga de faca..

*Em outra vida...*

O Wylder lembrava-se, em outra vida, o que custara sua aposta contra um Redcap..

*Uma parte do infinito.. * Pensava enquanto olhava para sua prótese quimérica..

Ao levantar a vista, ele avista a estranha figura de branco, que, naquele momento intrigava ao Exu, ela tinha uma história para contar, ele sabia, algo único, e, aquilo, acima de tudo o inspirava.

*Mas não existem caminhos errados.. apenas caminhos..*

Sustentando o sorriso como apenas uma alma artística conseguiria, ele fala, puxando, desajeitadamente uma lâmina do nada..

"-EU aceito a barganha, COM DUAS CONDIÇÕES, que, a briga seja pra ver quem é o caboco mais certeiro de nós atirando uma faca, mas, se eu ganhar, a moça bonita de vocês me conta no pé do ouvido um realzinho da história dela, afinal, eu sou aquele que já esteve nas terras onde as montanhas eram feitas de rapadura, tinha rio de leite e riacho de pinga, e, se quisesse comer um cuzcuz com carne seca, era só tirar uma pedra do rio de manhã e deixar ela secar até o meio dia, se eu perder, conto como chegar lá.."

Idris performava a figura do fanfarrão desajeitado..

*Não vou dar vantagem nenhuma imbecís..*

A Baronesa fica furiosa quando o "Capitão" não cede aos seus charmes, mas seu rosto permanece inalterado e sereno. Uma solução era proposta e Evony ficava feliz com o resultado, no máximo perderia um plebeu e nenhum deles era exatamente insubstituível. 

O Exu toma a frente da questão e resolve se oferecer para o desafio. A Baronesa sorri em aprovação e vira para o redcap e fala:

"- O que me diz então Capitão? Temos uma aposta?"

Zvenn não entendia a lógica de metade das ações tomadas pelo Exú, e a outra metade lhe atraía pouco interesse. A última no entanto lhe deixou com a pulga atrás da orelha e a resposta num dialeto do qual ele não entendera sequer uma palavra, atiçava ainda mais sua curiosidade. O "Capitão" que não gostava de ser tratado parece resistir aos encantos da Baronesa.

Eis que, como não poderia deixar de ser, o cangaceiro queria uma briga de facas e nesse momento o Sluagh apenas olha de rabo de olho pro Exú exibido. E naturalmente, ele ia se exibir. A Baronesa não tarda em concordar e Zvenn não tinha muito além de torcer.

*Minha vida balançando entre a diplomacia de uma nobre com um bando de cangaceios e o punhal de um Exú exibido.* - refletia silenciosamente enquanto aguardava para ver se as condições do Exú seriam aceitas.